2/24/2006

CARTA A MEUS FILHOS SOBRE OS FUZILAMENTOS DE GOYA

“El Tercero de Mayo 1808”1814
Museo del Prado, Madrid, España

Não sei, meus filhos, que mundo será o vosso.
É possível, porque tudo é possível, que ele seja
aquele que eu desejo para vós. Um simples mundo,
onde tudo tenha apenas a dificuldade que advém
de nada haver que não seja simples e natural.
Um mundo em que tudo seja permitido,
conforme o vosso gosto, o vosso anseio, o vosso prazer,
o vosso respeito pelos outros, o respeito dos outros por vós.
E é possível que não seja isto, nem sequer seja isto
o que vos interesse para viver. Tudo é possível,
ainda quando lutemos, como devemos lutar,
por quanto nos pareça a liberdade e a justiça,
ou mais que qualquer delas uma fiel
dedicação à honra de estar vivo.
Um dia sabereis que mais que a humanidade
não tem conta o número dos que pensaram assim,
amaram o seu semelhante no que ele tinha de único,
de insólito, de livre, de diferente,
e foram sacrificados, torturados, espancados,
para que os liquidasse com suma piedade e sem efusão de sangue.
Por serem fiéis a um deus, a um pensamento,
a uma pátria, uma esperança, ou muito apenas
à fome irrespondível que lhes roía as entranhas,
foram estripados, esfolados, queimados, gaseados,
e os seus corpos amontoados tão anonimamente quanto haviam vivido,
ou suas cinzas dispersas para que delas não restasse memória.
Às vezes, por serem de uma raça, outras
por serem de uma classe, expiaram todos
os erros que não tinham cometido ou não tinham consciência
de haver cometido. Mas também aconteceu
e acontece que não foram mortos.
Houve sempre infinitas maneiras de prevalecer,
aniquilando mansamente, delicadamente,
por ínvios caminhos quais se diz que são ínvios os de Deus.
Estes fuzilamentos, este heroísmo, este horror,
foi uma coisa, entre mil, acontecida em Espanha
há mais de um século e que por violenta e injusta
ofendeu o coração de um pintor chamado Goya,
que tinha um coração muito grande, cheio de fúria
e de amor. Mas isto nada é, meus filhos.
Apenas um episódio, um episódio breve,
nesta cadeia de que sois um elo (ou não sereis)
de ferro e de suor e sangue e algum sémen
a caminho do mundo que vos sonho.
Acreditai que nenhum mundo, que nada nem ninguém
vale mais que uma vida ou a alegria de tê-la.
É isto que mais importa -- essa alegria.
Acreditai que a dignidade em que hão-de falar-vos tanto
não é senão essa alegria que vem
de estar-se vivo e sabendo que nenhuma vez
alguém está menos vivo ou sofre ou morre
para que um de vós resista um pouco mais
à morte que é de todos e virá.
Que tudo isto sabereis serenamente,
sem culpas a ninguém, sem terror, sem ambição,
e sobretudo sem desapego ou indiferença,
ardentemente espero. Tanto sangue,
tanta dor, tanta angústia, um dia
-- mesmo que o tédio de um mundo feliz vos persiga --
não hão-de ser em vão. Confesso que
muitas vezes, pensando no horror de tantos séculos
de opressão e crueldade, hesito por momentos
e uma amargura me submerge inconsolável.
Serão ou não em vão? Mas, mesmo que o não sejam,
quem ressuscita esses milhões, quem restitui
não só a vida, mas tudo o que lhes foi tirado?
Nenhum Juízo Final, meus filhos, pode dar-lhes
aquele instante que não viveram, aquele objecto
que não fruíram, aquele gesto
de amor, que fariam «amanhã».
E, por isso, o mesmo mundo que criemos
nos cumpre tê-lo com cuidado, como coisa
que não é só nossa, que nos é cedida
para a guardarmos respeitosamente
em memória do sangue que nos corre nas veias,
da nossa carne que foi outra, do amor que
outros não amaram porque lho roubaram.
JORGE DE SENA

2/23/2006

Dia Europeu da Vítima.

Dar a cara por vezes é difícil, mas é necessário.


Segundo a APAV ( Associação Portuguesa de Apoio à Vitima ), o número total de denuncias de violência domestica tem vindo a diminuir.


Em contra ciclo encontram-se os números de denuncias de violência praticada contra crianças e, contra idosos.


Pode conhecer mais dados aqui.

E

aqui.


Pelo menos, pense nisto.

Obrigado.

2/21/2006

Lamento meu...

Nunca o belo canto de milhões, de não menos belos pássaros, a anunciar o romper da aurora,





Poderão abafar o grito, de uma só criança, que sofrendo... Chora!

2/17/2006

Oração "da minha" desumanidade...

Saturno de Goya





Oh Deuses como o de Goya pintor,
Que devora os seus filhos.
Oh Deuses que criastes a dor!
Oh Deuses causadores de todos os sarilhos.
Comei antes a mim,
E libertai-me assim, dos sentidos.
Libertai-me das encruzilhadas nos trilhos,
Deuses que no tempo estais esquecidos.
Oh Seres detentores de toda a Divindade,
Que falais Inglês, Chinês, Grego, Árabe e Latim,
Libertai-me de valores como a Liberdade,
O Amor e a Amizade,
O sentido de Igualdade,
Libertai-me do Pacifismo e da Fraternidade,
Acabai com a existência de mim.
Castrai-me todos os sonhos de Paz,
Tornai-me indiferente a todo aquele que jaz.
Preenchei-me de Raiva e Egoísmo,
De Ganância e da mais maquiavélica Maldade.
Dotai-me de Ódio e Inveja.
E se por acaso eu esboçar algum laivo de Altruísmo,
Atirai comigo ao mais profundo abismo.
Retirai a medida à minha Ambição,
Ou seja,
Impregnai-me daquilo a que eles chamam Razão.
Oh Deuses das Mortes e das Mutilações,
Deuses das Guerras entre Nações,
Transformai-me no ser mais insano,
Pois só assim, poderei ser humano.
Ou então, se Vos for mais fácil, criai uma Humanidade de verdade.
É que já começo a sentir os sinais do cansaço, desta minha Marginalidade!

2/16/2006

Semibreves muito breves II

Após um mês de espera pelos resultados do inquérito aberto pelo Sr. Procurador Geral da Republica, em relação à violação do segredo de justiça referente ao já celebre envelope 9, eis que obtemos as primeiras conclusões:

1º- Importante não é a violação propriamente dita, mas antes a ventilação dos factos. Ou seja, não é importante saber quem foi o Juiz, o Delegado do Ministério Publico, o funcionário judicial ou eventualmente o advogado que possa ter violado a lei, mas sim saber quem foi o jornalista que tornou publica a falta de seriedade e, de salvaguarda de direitos fundamentais em democracia. A esse é que há que se descobrir e castigar.

2º- No dia em que a Torre do Tombo, põe à disposição de todos os Portugueses documentação, de grande interesse, sobre o General Humberto Delgado, receberá a transladação da lei, que até agora dava o direito aos jornalistas, de salvaguardarem as suas fontes. “ Uma lei considerada fundamental em qualquer Estado de Direito “. Uma vez que se chegou ao desplante de apreender os computadores de jornalistas contendo todo o tipo de informação, ficando deste modo essa informação sujeita a todo e qualquer tipo de violação.

3º- E ultimo ponto. Numa altura em que tanto se fala em direitos, como por exemplo no direito da Liberdade de Expressão, dá-se uma rude machadada no Direito à Informação.
Bem sei que este caso teve origem na violação do segredo de justiça, mas a partir do momento em que esta informação chega ao conhecimento de um jornalista, não é dever deste informar os seus leitores?! Ou será que o assunto em causa não é preocupante para qualquer cidadão deste País? Quando está em causa a violação de direitos fundamentais dos cidadãos, sejam eles Presidente da Republica, Ministros, Deputados, Procurador Geral da Republica ou não, quando estão em causa Direitos fundamentais dizia eu e, o direito à privacidade é um desses direitos, este assunto tem forçosamente que se tornar público, pois passa a dizer respeito a todos nós.


Nota final: O governo para combater estas ilegalidades, ( algumas delas cometidas com a sua conivência ), pretende criar um órgão composto por elementos por si nomeados, com o intuito destes fiscalizarem as escutas telefónicas. Não sendo capaz o governo de perceber, que essa medida só iria criar mais desconfiança e insegurança por parte dos cidadãos, em relação a salvaguarda de um direito, que lhe está atribuído mundialmente, que é o direito à sua intimidade e privacidade!?
Aproveitando esta nota final faço um apelo aos Srs. Políticos, aos Srs. Agentes de Investigação e aos variados Srs. Agentes Judiciais: “ Por favor, sejam sérios meus Srs.”.

Semibreves muito breves I

Um Ministro iluminado do meu País, veio a publico dizer que era intenção do governo, fazer voltar ao activo aqueles que tinham feito acordos para obter a reforma antecipada.
Mais informou o referido Ministro que o calculo para o valor das reformas passará a contemplar toda a vida laboral e não só os 10 melhores anos dos últimos 15.
É claro que, por detrás destas revelações está a intenção do Sr. Ministro de poupar dinheiro.
É puro engano seu Sr. Ministro!
Ora se com a primeira medida aqui citada o Sr. poupará nas reformas, acabará por gastar o mesmo em fundo de desemprego. Bem sei da possibilidade de uma parte dos cidadãos que vierem a ser contemplados com estas medidas, terminarem o prazo em que têm direito ao subsidio de desemprego ainda antes de terem idade para voltarem à reforma e, aí poder-se-á poupar uns trocados. Ou não!... Se eles recorrerem ao rendimento mínimo.
Quanto à segunda medida anunciada, é deveras denunciadora de que o Sr. já não tem pais, ou se os tem serão com certeza pessoas avantajadas, tal como o Sr.! sabe Sr. Ministro, esta medida não afectará os alarves desta sociedade, mas será bastante penalizadora para o povo deste País. É que para estes últimos, muitos deles a viver abaixo do limiar da pobreza, esta medida representa a necessidade de deixar de fazer refeições só com uma sopa para passar a fazer as mesmas refeições só com um pão.
Eu até lhe poderia explicar que mesmo aqui é ilusória a poupança das verbas do Estado. Não pode o Sr. ministro ignorar que reduzindo a possibilidade de uma "qualquer coisinha" melhor qualidade de vida a estas pessoas, o consumo “mesmo que sendo unicamente de bens de primeira necessidade”, irá reduzir também. Logo as receitas do IVA irão baixar e como diz o povo: “ vai-te lucro que me dás perda “.
É claro que poderemos sempre apostar que provocando uma depressão colectiva, como será o caso na eventualidade dessas medidas irem por diante, as pessoas se comecem a suicidar em massa e, assim finalmente possamos obter a sua desejada poupança nas contas publicas.
Tenha vergonha Sr. Ministro.
Use(m) é da imaginação para encontrar soluções para acabar com o défice, primeiro com o vosso défice de social e depois com o défice da economia.
Só para terminar Sr. ministro permita-me uma perguntinha: - Não é por acaso o Sr. um dos vários Ministros deste governo, que para além do ordenado recebem chorudas reformas por alguns poucos anos de serviço?

2/15/2006

Dia, “dos namorados”, descompassado.

Poema de Amor

Esta noite sonhei oferecer-te o anel de Saturno
E quase ia morrendo com o receio de que não te coubesse no dedo.

2/13/2006

100 anos


São meus discípulos, se alguns tenho, os que estão contra mim; porque esses guardaram no fundo da alma a força que verdadeiramente me anima e que mais desejaria transmitir-lhes: a de se não conformarem”.

"O homem não nasceu para trabalhar, mas para criar."
George AGOSTINHO Baptista da SILVA nasceu no Porto em 13 de Fevereiro de 1906.
Fez os estudos secundários e universitários naquela cidade, licenciando-se e doutorando-se (1929) em Filologia Clássica, na Faculdade de Letras.
Após o encerramento compulsivo dessa Faculdade, frequentou em Lisboa a Escola Normal Superior e trabalhou como bolseiro na Sorbonne e no Collège de France (1931/33).
Mandado regressar a Portugal, foi colocado no Liceu de Aveiro, vindo a ser demitido do ensino oficial, por motivos políticos, em 1935.
Depois de uma passagem pelo, “Centro de Estudos Históricos”, de Madrid, como bolseiro da “Junta de Relaciones Exteriores” espanhola, residiu em Lisboa até 1944, vivendo de aulas particulares e empenhando-se em diversas actividades de produção e difusão culturais. Manteve entretanto, desde os seus tempos do Porto, relações com o grupo da Seara Nova e, numa segunda fase, mais em particular com António Sérgio.
Em 1944, emigra para o Brasil, onde se fixa, depois de breves passagens pelo Uruguai e pela Argentina (1945-47). A sua permanência no Brasil aparece ligada a todo um notável conjunto de realizações culturais em sentido amplo, nomeadamente, a fundação do Instituto Oswaldo Cruz do Rio de Janeiro, da estação ecológica do Parque Itatiaia e a criação pioneira de universidades em zonas afastadas dos grandes centros (Paraíba, Santa Catarina), do Centro Brasileiro de Estudos Portugueses na Universidade de Brasília e do Centro de Estudos Africanos e Orientais, na Baía. Leccionou nas Universidades de Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Paraíba, Minas Gerais, St. Catarina, Baia e Brasília.
Regressa a Portugal em 1969, prosseguindo aqui e na Galiza a sua actividade cultural.

A obra publicada de Agostinho da Silva reparte-se por diversos domínios: estudos clássicos (Breve ensaio sobre Pérsio, Sentido histórico das civilizações clássicas, A religião grega), tradução e apresentação de textos clássicos e modernos (Sófocles, Platão, Aristófanes, Lucrécio, Plauto, Terêncio, Teócrito, Catulo, Salústio, Suetónio, Tácito, Montaigne), biografias (Pestalozzi, Francisco de Assis, Franklin, Lamennais, Miguel Angelo, Pasteur, Lincoln, Robert Owen, Washington, Leopardi, Leonardo da Vinci, Montaigne), pedagogia (Sanderson e a Escola de Oundle, 0 Método Montessori), divulgação cultural, artística e científica (os Cadernos Iniciação, textos para a juventude, etc.), ensaísmo (Glossas, Conversa com Diotima, Parábola da mulher de Loth, Considerações, Sete Cartas a um Jovem Filósofo, Reflexão à margem da literatura portuguesa, Um Fernando Pessoa, As Aproximações), ficção (Herta - Teresinha - Joan). Além das obras publicadas em volume, precedentemente resenhadas sem pretensões de exaustividade, deve assinalar-se uma abundante produção de artigos esparsos por revistas e jornais, como A Águia, Dyonisos, Seara Nova, Revista de Portugal, Pensamento, 0 Instituto, Boletim de Filologia, 57, Espiral, Tempo Presente, 0 Tempo e o Modo, Cultura Portuguesa, Nova Renascença, Vida Mundial, Noticia, etc.

2/07/2006

Sobre a revolta, pela violência, da revolta pelos cartoons.


Porque não sei traçar com facilidade,
Este é o meu cartoon sobre a ocidental moralidade.
Porque para mim um ser humano,
É sempre um ser humano,
Quer seja podre de rico ou um mendigo,
Quer seja budista, católico ou muçulmano.
Porque me enoja a hipocrisia da minha sociedade,
Porque reconheço os limites da minha liberdade,
Levanto a minha voz e digo…

…Não!... Não é uma bandeira da Dinamarca a arder que me revolta. Nem tão pouco,
Uma embaixada, a ser invadida ou incendiada por uma multidão irada.
Aquilo que a mim, enquanto ser humano, realmente me faz sofrer e me deixa louco,
É ter que assistir à reunião de toda uma família amortalhada!

À ira dessa gente, quem a fomentou?
Terá sido, a sapiência que fala, de democracia e tolerância… cá no Ocidente?...
Para quem é indiferente… uma bomba uma bala, que mata um pai, uma mãe ou interrompe uma infância… lá no Médio Oriente.
Mas que no fim, por se dizer ateu ou laico, culpa sempre o Deus de quem morreu e, nunca o de quem matou!
Eu sei que custa, mas esta verdade é inegável. A não ser…
Que seja um ocidental a morrer.
E não me venham com a liberdade de expressão.
Pois… essa, não abrange o insulto, nem tão pouco a provocação.
E já agora citando um provérbio índio,
Que julgo não existir e que por isso terá que ser por mim inventado!:
“ Se com um Lobo lutares… sairás derrotado!
Mas se o souberes respeitar… sairás respeitado! “

PS: respeito todas as opiniões, só não respeitarei o insulto!

2/02/2006

Porque me parece merecedor de reflexão!...


Mandaram-me esta noticia por e-mail. Resolvi fazer dela um Post, porque me parece cada vez mais urgente uma reflexão sobre os caminhos que as sociedades estão a tomar.
Será que para se vencer nesta sociedade temos de abdicar de toda a nossa dignidade enquanto seres humanos?